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Amor é reality show

  • Ramon Cotta
  • 19 de dez. de 2017
  • 3 min de leitura

Ela sentou ao meu lado no ônibus. Dei um sorriso e recebi como resposta uma cara fechada. Percebi uma apreensão e ansiedade.

Após se sentar e se acomodar, ela começou a chorar. Nessas horas, nunca sei o que eu faço. Se eu pergunto como a pessoa está, se eu a abraço, se eu choro junto ou se eu ignoro. Fiquei na minha, em silêncio.

Olho pela janela e vejo um moço dando um tchauzinho e, rapidamente, ela acenou para ele. Naquele momento percebi que era uma despedida entre um casal apaixonado.

Meu coração doeu. Já passei por isso e chorei uma viagem inteira ao som de Amy Winehouse, olhando pela janela em um típico clipe dramático em preto e branco, saca!?

A moça chorava ao meu lado. O rapaz, com os olhos cheios d’água, fazia sinal para ela parar de chorar. O ônibus partiu e eles se despediram. Ela continuava aflita e chorosa.

O celular dela tocou. Eu, bem xereta, vi que o nome da agenda que a ligava era nomeado pelo apelido “Meu”.

Na hora julguei e só pensava que cafonice ela nomear o boy dela de “Meu” na agenda telefônica. Em seguida, pensei que até que era um apelido fofo, pode ser uma maneira que eles se referem um ao outro: Meu e Minha.

Eles conversaram sobre um fone de um ouvido e encerraram a conversa logo. Estranhei a forma fria, não pareciam aquele casal apaixonado da romântica despedida. Não teve um “eu te amo” e nem palavras carinhosas.

Depois de um tempo, ela gravou um áudio para uma amiga e acompanhei o seguinte diálogo:

- Já mandei nosso nome para a lista do camarote. Nós vamos, sim, faço questão de postar fotos da gente no Instagram. Ele me desbloqueou. Ele tá fingindo que tá tudo bem, que não tá ligando que eu tô indo embora, mas eu sei que no fundo tá sofrendo. Ele me desbloqueou pra ver o que eu estou fazendo. Por isso, faço questão de postar as fotos da gente na festa, amiga.

Encerraram o assunto e não sei o desfecho do rolê.

Mas só fiquei pensando em que fase da vida deixamos de ser apaixonados a lá Shakespeare para jogadores de amor.

Estratégias, cenas falsas de alegria ou tristeza nas redes sociais, diálogos criados na mente para tentar sair como vencedor neste game onde não se fala a sinceridade, o “eu te amo” espontâneo e em que encenação é tão valiosa em algo que deveria ser real e transparente.

Pensei o tanto de tempo e desgaste que um casal perde ao não jogar limpo e preferir decorar roteiros e iludir ao outro e, principalmente, a si próprio.

Quem ama não joga. Amor não é uma disputa de cabo de força. No amor, ambos têm que ganhar. Quem ama não quer se mostrar maior que o outro. Amor é equidade de sentimento, é reciprocidade sem precisar de dramalhão.

Que sigamos um textão do gênio Xico Sá, que ele diz que na economia da vida, o maior desperdício é fazer poupança de amor. Amor é pra gastar. Triste de quem sente e esconde, de quem sente e fica no joguinho dramático, de quem sente e guarda a sete chaves. Xico ainda diz:

“Não existe essa de amor só amanhã, como na placa do fiado do boteco. Amor é hoje, aqui, agora.”

Amor não é novela, amor não é torneio. Amor é reality show.

 
 
 

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Calma, eu me perdi aqui © 2016 por Ramon Cotta 

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