top of page

Inútil


Ando pensando muito, mas escrevendo pouco. Refletindo e evitando. Evitando a realidade. Afastando os problemas. Mergulhando no Rei Leão e maratonando Queer Eye e Euphoria.

Eu poderia falar da declaração do Presidente, que afirmou que não tem mais brasileiro passando fome. Ou eu poderia mostrar toda minha revolta com a Ministra do Direitos Humanas que disse que meninas são estupradas na Ilha de Marajó, no Pará, por não usarem calcinha. E completou o show de horrores ao sugerir levar uma fábrica de calcinhas pra lá como a solução dos estupros.

Vontade de xingar, protestar, queimar pneu, colocar fogo em ônibus e fazer stories, claro.

Mas uma pergunta ecoa bem dentro de mim:

Imagina se fosse o Lula indicando o filho pra embaixada ou levando os familiares pra um casamento usando o helicóptero do governo?

Vivemos de verdade esse Brasil atual ou é tudo um delírio coletivo?

Respiro. Respiro. Respiro.

Há dois Brasis. Aquele que nega a realidade, que olha pro próprio umbigo. Aquele em que o feminismo é o mesmo que machismo, Aquele em que o racismo é invenção da lacração, Aquele em que a heterofobia é existente, Aquele em que o pobre é o culpado pela pobreza E aquele que ainda defende o indefensável 17 vezes se for preciso.

Mas há aquele Brasil do Ronald. Ronald, 17 anos, artilheiro destaque da Taça das favelas do Rio de Janeiro, do time Gogó da Ema, de Belford Roxo, que ao vencer, disse, ao vivo, bem emocionado, o seguinte discurso:

"Nós somos merecedores. Tenho que agradecer muito a Deus, porque só ele sabe da dificuldade que é para a gente treinar, que é para alguém que falta comida dentro de casa ser um espelho para alguém lá da nossa favela. Toda vez que sai na televisão (sobre a favela) só sai morte, só sai os amigos da gente sendo preso. Mas hoje a gente fez história, para todo mundo acreditar que Deus realiza sonhos".

Há aquele Brasil do Antônio Carlos, pedreiro que gravou a reação da sua filha de 5 anos de idade recebendo uma fatia de bolo como presente de aniversário. Ao entregar o presente, ele disse:

“Feliz aniversário, meu amor. Papai te ama muito. Que Deus te dê muitos anos de vida e saúde. Papai ainda vai te dar muito. É só um bolinho que papai comprou”, disse o pai abraçado e chorando com a filha.

Há Brasis e brasileiros. Parodiando o que eu vi aí, Tem gente passando fome, tem gente passando pano, tem gente passando raiva e tem gente passando vergonha.

E complemento: e têm Ronalds, Antonios e gentes que não vivem, sobrevivem uma vida que pouco importa o Lula livre ou o seu mito 17.

Existem Brasis, gentes, histórias, uma realidade distante do nosso privilégio e do nosso umbigo que precisa ser ouvida e compartilhada.

Respiro, ouço, apoio E posto. Me culpo, me sinto bastante impotente e cada vez mais acredito que aquela canção representa todos nós:

A gente não “sabemos” tomar conta da gente. Inútil! A gente “somos” inútil.

Inútil, presidente, inútil!

Posts Destacados 
Posts Recentes 
Siga
  • Facebook Long Shadow
  • Twitter Long Shadow
  • YouTube Long Shadow
  • Instagram Long Shadow
Procure por Tags
Nenhum tag.
bottom of page